sexta-feira, 7 de maio de 2004

O atropelamento

Hoje passei por uma experiência que julgo inesquecível, um acontecimento que elevou minha alma e meu corpo, elevou a aproximadamente dois metros. Sim! Hoje, pela primeira vez: Fui atropelado!


Estava voltando elegantemente da minha aula de Psicologia da Educação (aula que eu julgava tão incômoda quanto um atropelamento), quando já na calçada da UERJ vi, uns duzentos metros adiante, uma mulher gritando e apanhando bonito de um malandro, virei a cara e pensei: "que feio, um casal caindo na porrada no meio da rua!". Dei mais uns passos e percebi que a mulher lutava para manter consigo sua bolsa e gritava por socorro. Era um assalto! Nisso, comecei a correr em direção a eles, quando, um outro homem, na direção contrário a minha, também percebeu o assalto e tomou a mesma atitude, o bandido, espertamente calculou as distâncias de seus dois perseguidores e fugiu na direção do que estava mais distante: Eu. Enquanto corríamos feito dois cavaleiros medievais, dois kamikazes, dois antílopes etc., eu pensava se voaria no seu peito e na sua cara, ou se aplicaria uma rasteira. Em atitude de desespero, ele decidiu atravessar a rua, mesmo sem saber se vinha ou não algum carro, pois havia um ônibus enguiçado numa das pistas tirando assim tanto a sua visão da rua quanto a minha. Era melhor arriscar, e ele arriscou. Atravessou sem nenhum problema. E eu pensei "seja o que Deus quiser" e...

Era um carro preto, reparei a cor enquanto eu voava, pensei também na minha aterrissagem: "Como será?". O atropelamento em si até me pareceu macio. Enfim, após algum tempo e algumas reflexões sobre as aulas de Psicologia, pousei! Poderia ter sido melhor, mas poderia ter sido muito pior. Cheguei ao chão, mas continuei girando... Parei. Fiquei menos tempo estatelado no chão do que havia ficado suspenso no ar.

Levantei-me com as pernas trêmulas. Primeiro procurei meu tênis, reparei que minha calça estava vergonhosamente rasgada e eu vergonhosamente sujo. Uma multidão de meia dúzia de cinco pessoas me cercou, todos preocupados e atenciosos, me ofereceram ajuda, carona, perguntaram várias vezes se eu estava bem...: "E as pernas...?"; "Respira fundo!"; "Estufa o peito!"; "Vamos pro hospital!"; "Vamos pra UERJ"...

Acabei aceitando do meu atropelador, uma carona até minha casa, não por não me sentir fisicamente bem para andar, mais porque eu estava com um aspecto desonroso, poderia até bagunçar o cabelo e dizer que sou 'punk', mas a idéia da carona me pareceu mais razoável.

Cheguei à casa e havia uma mulher pedindo roupa para alguma campanha de caridade, mas quando ela me viu —coitada! —, achou que a situação ali estava braba e foi embora.
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Minha mãe me disse que eu não tenho que "dar uma de herói". Dispenso esse tipo de comentário. Não dá pra ser indiferente nesses casos tão absurdos.
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Afinal: Indignar-se com injustiças não faz mal a ninguém! Atropelamento é que faz!

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